Além dos sem-terra, dos sem-teto e por aí afora, outra categoria começa a se formar e ameaçar a aspiração do Brasil de se aproximar do Primeiro Mundo: é a dos “sem-computadorâ€, ou “sem-telaâ€. Atropelado pelo avanço das tecnologias da informação e comunicação, que lançaram as bases de uma sociedade onde o conhecimento é o bem mais precioso, o país mais desigual do mundo - onde nem 15% dos jovens chegam à universidade e o analfabetismo funcional estreita os horizontes intelectuais de metade da população - teme que a exclusão digital acrescente mais anos-luz à distância entre o sem-educação e os educados. Por isso, promete investir pesado no que o ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, aponta como o maior programa de democratização digital do mundo em desenvolvimento.
O Telecomunidade, financiado pelo Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (formado por 1% da receita líquida de empresas do setor, foi lançado em fevereiro de 2001. Deste então, muito apostaram que, como costuma ocorrer com programas sociais por aqui, ele sofreria cortes e dilatação de prazos. Mais adiante, o caso Windows versus Linus brecou as licitações. Agora, há quem lance farpas até contra o projeto dos computadores populares, encomendado pelo Ministério das Comunicações ao presidente do Conselho Gestor da Internet, Ivan de Moura Campos. Projeto concretizado, as máquinas chegarão ao mercado no segundo semestre de 2002 ao preço médio de R$ 500, financiados em 36 meses. Mas, prosseguem os críticos, o que os sem-educação farão com um computador? Em pouco tempo estarão cercados de teias de aranha.
A apatia, em parte, pode ser debitada na conta da formação recebida pelos professores, ainda calcada na idéia de educação como processo de transmissão de conhecimentos, no qual o principal sujeito fica entre os alunos e o quadro-negro. A educação como construção coletiva, que requer a interação entre aluno, professor e fonte do conhecimento, é idéia nova, que se fortaleceu nas últimas décadas e foi potencializada com a expansão das redes de informação. A escola, porém, resiste a inovações. Problema agravado por fatores como a infra-estrutura precária, com turnos apertados, sem tempo para bons trabalhos em torno da Internet. Outro empeço é a falta de capacitação e retorno financeiro para mais esta incumbência. Desafios para os sistemas de ensino.
Entretanto, com os computadores populares, o trabalho dos professores será facilitado. Mais estudantes poderão estudar e fazer pesquisas em casa, levando para as aulas suas descobertas, quando aprenderão a julgá-las e transformá-las em conhecimento útil.
Contudo, insistem os críticos, quem cuidará da manutenção dos equipamentos nos órgãos públicos? E as máquinas baratas? Funcionarão a contento? Não sabemos. Encaremos o Telecomunidade como alavanca para a democratização digital. Paralelamente, discutamos o barateamento de impulsos telefônicos para a Internet, a necessidade de o governo criar incentivos para novas indústrias de informática e atividades de pesquisa na área. A própria sociedade brasileira, num futuro breve, mais familiarizada com o mundo digital, demandará computadores baratos mas de qualidade, exigirá eficiência das prestadoras de serviços e, das escolas, exigirá atualização e afinação com a realidade. Sobretudo, os menos favorecidos experimentarão o prazer de romper o isolamento e desfrutar seu direito básico à informação, à participação, ao crescimento. (Magno de Aguiar Maranhão - Conselheiro do Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro, Presidente da Associação Nacionals dos Centros Universitários - Anaceu)