07 de dezembro de 2025
Articulistas

Irresponsabilidade política

Antonio Delfim Netto
| Tempo de leitura: 3 min

Aos poucos, o ministro do Desenvolvimento, Sérgio Amaral, está conseguindo mudar a orientação da política econômica, fazendo o governo renegar a velha posição segundo a qual o Brasil não precisa construir saldos comerciais. A nova orientação tem avançado mas não sem encontrar focos de resistência que em certos momentos produziram manifestações que beiram a imbecilidade. O leitor deve perdoar a “deselegância”, compreendendo que é difícil conservar a serenidade após tantos anos de advertências a respeito do crescimento da vulnerabilidade externa de nossa economia. Um estado de dependência construído graças à irresponsabilidade política daqueles que traduziam monocordiamente a cartilha de seus gurus globais transmitindo aos brasileiros a “certeza” que, num mundo de ampla liberdade de movimentos de capitais, seria tolice insistir na realização de superávits no comércio exterior.

Qualquer observação que se fizesse a propósito da necessidade de corrigir a política cambial, de ampliar o financiamento às exportações ou de aliviar a carga tributária que reduz a nossa capacidade de competir no exterior era rebatida com desdém e desqualificada como obra do “lobby exportador”... Três anos após a flexibilização cambial (que evitou o pior, ao interromper a escalada dos déficits comerciais), ainda prevalece em várias áreas do governo uma atitude de indiferença quanto à necessidade de transformar as exportações em objetivo prioritário. Apesar da propaganda, o Banco do Brasil não gasta um décimo do esforço que despende para empurrar papelório na sua clientela cativa, com a procura de oportunidades e a oferta de crédito a potenciais exportadores. Antes de ingressar na “modernidade” da agiotagem oficial, as agências do BB eram o principal instrumento de ligação com o exterior das empresas espalhadas pelo interior do País. A sua atual abstinência é que pode explicar a angustiada proposta do Ministro Sérgio Amaral de criar um banco de comércio exterior. É evidente que não haveria a proposta se o Banco do Brasil estivesse engajado no financiamento das exportações.

O mais grave é que não se trata de simples negligência. Em altos escalões da equipe econômica mal se disfarça o viés antiexportador. Quando recentemente empresários do setor elevaram o tom das críticas diante da manutenção de juros escorchantes e da elevada carga tributária que penaliza as exportações, a resposta da autoridade não deixou muitas dúvidas: tratava-se da “habitual choradeira de industriais paulistas que pretendem restabelecer reservas de mercado e sonham com crédito fácil e juros subsidiados...”

Foi com manifestações de prepotência dessa ordem que o governo fugiu ao debate sobre a nefasta política cambial que em 4 anos construiu a enorme dívida externa, dificilmente financiável. Não se pode admitir que isso se repita em relação à política de comércio exterior. Por esta razão é importante apoiar a posição do ministro Sérgio Amaral quando ele diz que precisamos construir saldos comerciais robustos para reduzir a vulnerabilidade que impede a retomada do crescimento econômico. Sem estímulos oficiais que permitam aumentar rapidamente as exportações, sem a superação do viés antiexportador que ainda persiste em várias áreas do governo, a dependência externa continuará crescendo e a situação do Brasil ficará extremamente complicada. É muita irresponsabilidade política imaginar que este é um problema para o próximo governo... (O autor, Antonio Delfim Netto, é deputado federal pelo PPB-SP, professor emérito da USP)