25 de dezembro de 2025
Regional

Douradense: agonia de uma ferrovia

Tribuna Impressa
| Tempo de leitura: 4 min

Araraquara - Em 1896 - apenas 44 anos depois que Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá - Ciro Marcondes Resende, um fazendeiro rico, inicia a construção da primeira estrada de ferro no Brasil e recebe do Estado de São Paulo concessão para a construção da Companhia Estrada de Ferro Dourado (CEDF), conhecida como Douradense. Inaugurada em 1900, seu primeiro trecho, com 20 quilômetros, ligava as cidades de Ribeirão Bonito e Dourado, todo ele construído com recursos próprios.

O desenvolvimento da região está ligado à história dessa ferrovia, tese de mestrado defendida na Unesp de Araraquara por Ivanil Nunes, intitulada “Douradense: a agonia de uma ferrovia”. A dissertação foi apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Economia, da Universidade Estadual Paulista, câmpus de Araraquara para a obtenção do título de Mestre em Economia (Área de Concentração: História Econômica).

O interesse de Ivanil pela ferrovia está ligado ao início de sua vida profissional. Ele conta que foi trabalhar na Ferrovias Paulista S/A (Fepasa) por necessidade. “Era um bom trabalho, me apaixonei por ele. Fui controlador de tráfego, mas via na ferrovia uma deficiência, mais especificamente sobre a Douradense, onde não existiam dados históricos sobre ela. Quando terminei meu bacharelado em sociologia, aproveitei a idéia de um amigo de trabalho que me perguntava sempre por que não escrevia a história dessa estrada de ferro”.

Foi isso que ele fez. Depois de uma grande pesquisa, escreveu toda a tese com base na história e na importância dessa ferrovia, como transporte para o crescimento e desenvolvimento da região da araraquarense.

Anos “douradenses”

Ivanil conta que mesmo com a primeira crise cafeeira, entre 1896 e 1910, a “Douradense” se expandiu por ser uma ferrovia de grande importância da região araraquarense, que crescia com a economia cafeeira. “Sua importância não era só o transporte do café, mas atender as necessidades de transporte dos imigrantes e outros produtos agrícolas da região”, ressalta.

A Douradense atendia aos municípios de Ribeirão Bonito, Boa Esperança do Sul, Nova Europa, Tabatinga, Ibitinga, Itápolis, Borborema, Novo Horizonte, Bocaina, Bariri e Jaú. O ponto de contato com a Companhia Paulista era em Ribeirão Bonito e em Jaú. A linha-tronco se estendia para Oeste do Estado até a cidade de Novo Horizonte, tendo à esquerda o Rio Tietê e à direita a E.F. Araraquara, com a qual mantinha contato através da estação de Tabatinga.

As primeiras dificuldades começaram a surgir com a Primeira Guerra Mundial; aliada à crise do café; aos juros de sua dívida e a concorrência que começou a tomar forma com o transporte rodoviário. Em 1940, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro adquiriu 80% do capital da empresa. “O aparecimento das jardineiras (antigos ônibus com capacidade para até 30 passageiros) e automóveis, que transportavam passageiros da linha da Douradense para as linhas da Companhia Paulista; dos caminhões utilizados no transporte dos produtos agrícolas e a melhoria das estradas de rodagem, aumentaram ainda mais as dificuldades da estrada de ferro”.

Apesar desses fatores, a Douradense continuou como ferrovia lucrativa para a Cia. Paulista até a primeira metade da década de 60. “Houve substancial redução no transporte de café e passageiros, mas um aumento no transporte de outras mercadorias, por exemplo, o gado”.

O interesse da Cia. Paulista na Douradense era estratégico. Esta chegava a lugares distantes utilizando-se de linhas ramais, com trilhos de bitolas estreitas, onde a Paulista não conseguia chegar por rodar sobre bitola larga.

Fim da Douradense foi agonizante

Araraquara - Em dezembro de 1955, o Decreto-lei 2.698 estabelece a substituição das ferrovias deficitárias pelo que Ivanil chamou de “rodoviarismo”. Esse decreto determinava o início da erradicação dos trilhos, arrancados e substituídos por camadas asfálticas. “O final da Douradense foi demorado, como uma agonia”, compara Ivanil. As estações se transformam em prédios fechados ou alugados a repartições públicas do Estado ou municipais. Os vagões, ou são transformados em sucatas ou vendidos a outras empresas ferroviárias que adaptam seus rodeiros para a bitola larga.

No dia 3 de janeiro de 1969, o último trem parou na estação de Ribeirão Bonito, o maquinista desligou, fechou a locomotiva e vai para a casa descansar. Tem a certeza de que no dia seguinte não mais vai ter um trem para conduzir.

Notas

A Companhia Estrada de Ferro Dourado (CEDF) atendia os municípios de Ribeirão Bonito; Boa Esperança do Sul; Nova Europa; Tabatinga, Ibitinga; Itápolis; Borborema; Novo Horizonte; Bocaina; Bariri e Jaú.

As estações de Ribeirão Bonito e Jaú eram entroncamento com as linhas CP, Companhia Paulista de Estradas de Ferro.

O Departamento Nacional de Estradas de Ferro (DNEF) classificou as estradas de ferro em categorias econômicas de acordo com sua renda bruta anual.

Primeira categoria as ferrovias com renda superior à vinte mil contos de réis, segunda categoria, com renda entre vinte e cinco mil réis e terceira categoria, renda inferior à cinco mil réis.

A Estrada de Ferro Araraquara (EFA) foi classificada como de segunda categoria. Bitolas - a estreita possui um metro de largura entre trilhos, a bitola larga um metro e sessenta.