Os especialistas de plantão sempre têm respostas prontas sobre mecânica automobilística, muitas delas baseadas em históricos, lendas ou tradições que nada tem a ver com a realidade atual. Falam com uma seriedade que parece verdade, citando números mágicos que dão uma aparência de realidade e o povo leigo aceita sem questionamento. Vários destes fatos já foram comentados nesta coluna, mas vamos ver alguns dos mais comuns, para servir de balizamento e formar um conhecimento melhor. Por exemplo:
“Amortecedor se troca com 30 mil km”: quem nunca ouviu isso? Foi uma campanha lançada no passado por um grande fabricante, que usou uma média histórica como regra para todos, só que, na verdade, um amortecedor dura de forma diferente para cada usuário. Quem transita apenas em cidades muito bem pavimentadas (o que não é o nosso caso aqui) ou estradas excelentes, sem abusar de velocidades em curvas ou excesso de carga, poderá atingir mais de 100 mil km de vida de um bom amortecedor, antes que este rompa seus selos de vedação e perca eficiência. Já quem trafega com muito peso ou por ruas esburacadas, que forçam muito a suspensão e consequentemente os amortecedores, podem ter uma vida média até inferior aos 30 mil km alegados. Acredito que para um uso “normal” a média hoje esteja em 50 mil km, portanto trocar os amortecedores com 30 mil ou 40 mil km é jogar dinheiro fora.
Outra: “Carro com 80 mil km está velho e precisando ser trocado”. Grande bobagem! Quem roda pouco, de 15 mil a 20 mil km por ano, pode até querem trocar de carro após quatro ou cinco anos mais pela desvalorização do veículo ou por querer variar um pouco de marca ou modelo, mas nunca por que o carro ficou velho pelo uso. Os motores modernos duram mais de 250 mil km sem precisar de retífica ou de grandes manutenções, e o carro como um todo pode ter a vida ainda muito maior do que isso, desde que bem mantidos. São conhecidos casos de táxis com mais de 400 mil km rodados, em perfeitas condições, portanto o número mágico de 80 mil a 100 mil km não é parâmetro de vida útil para ninguém.
Mais uma: “A pressão dos pneus é de 28 libras”. É o número mágico preferido pelos frentistas. Parou no posto para calibrar os pneus e lá vem o expert dizer “- 28 nas quatro, doutor?”... Quem disse que o meu carro anda com a mesma calibragem de um fusca? Cada carro tem uma medida específica de pressão dos pneus, inclusive diferente para a dianteira e para a traseira, com carga ou sem, escrita normalmente na parte interna da tampa do combustível ou na lateral da coluna das portas dianteiras, mas com certeza constam do manual do proprietário. Veja sempre qual é a pressão recomendada pelo fabricante, para o seu modelo específico.
A mais comum: “Este óleo é para 5.000 km.” Só se for de marca muito ruim, não recomendada. Quem define a hora da troca é o fabricante do motor (ou do veículo), baseado no uso que se vai fazer do mesmo. A imensa maioria dos veículos modernos requer troca a cada 7.500 ou 10 mil km, sendo que alguns já alcançam os 15 mil km de intervalo entre as trocas. Os óleos de marca boa geralmente superam as exigências da indústria, portanto por que trocar antes da hora? Só em duas situações isto se aplica: se o proprietário rodar realmente muito pouco e levar mais do que seis meses para completar a quilometragem de troca (pois o óleo pode se oxidar e perder as características originais de lubrificação) ou em caso de uso abusivo, com muita carga, velocidade alta ou poeira. Nestes casos recomenda-se a troca antecipada.
“Trocar a correia dentada a cada 50 mil km.” Cada fabricante recomenda um valor conforme seu projeto, que pode variar de 50, 75, 100 e até 150 mil km para troca. Deve-se verificar a correia dentada a cada 50 mil km, mas trocar apenas se necessário. Portanto, se generalizar, estará trocando à toa. Existem muitas outras situações como estas, mas sempre lembro que o melhor é usar o bom senso e consultar o manual do proprietário ou seu mecânico de confiança. A informação técnica adequada ajuda a economizar bastante e a manter o carro sempre em ordem, disponível e seguro a qualquer momento.
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* Marcos Serra Negra Camerini é engenheiro mecânico formado pela Escola Politécnica da USP, pós-graduado em administração industrial e marketing e engenharia aeronáutica, com passagens como executivo na General Motors (GM) e Opel. Também é consultor de empresas e é diretor geral da Tryor Veículos Especiais Ltda. Seu site é www.marcoscamerini.com.br.