"Ser honesto e trabalhador viraram virtudes. Pô, é obrigação". O desabafo, do técnico de futebol Émerson Leão, em entrevista publicada na semana passada na imprensa denota não apenas o deslumbre de atletas que correm atrás da bola mas perseguem o dinheiro. A declaração vem a calhar com a atual sociedade.
Numa época quando o caráter deixou de ser item de série, índole e ética, independentemente dos sinais dos tempos, integram um pacote básico de requisitos que tornam o profissional cobiçado, seja para cargos na empresa onde já trabalha ou para alçar desafios em outros lugares.
Esse pacote de qualificações, segundo especialistas, transcende a competência específica para o cargo, e é apresentado numa espécie de "kit", chamado por eles de marketing pessoal.
Especialmente nos últimos anos, esse conjunto de qualidades deixou o campo empírico para ser encarado, de fato, como objeto de estudo.
De acordo com consultores, não basta ser bom apenas. Ou seja, o velho chavão: "não basta botar o ovo, tem que cacarejar", está mais do que atual.
Para eles, o candidato a uma vaga ou promoção deve se empenhar não apenas em ser o melhor no que faz, mas também aparentar.
Exemplos de conduta (cortesia, pontualidade, honestidade, ...), por mais "obsoletos" que soem no atual mundo onde os fins não justificam os meios, fazem, sim, a diferença. Mas as qualidades, que devem vir de berço, devem andar de mãos dadas com competência e técnicas de propaganda.
É isso mesmo. Bons relacionamentos, humor em alta, aparência, além dos quesitos apontados acima, entre outros, fazem parte de um verdadeiro kit promocional que devemos oferecer ao nosso "público", ou seja, futuros contratantes ou pessoas que abreviarão o caminho até eles.
Lebre por lebre
Um dos mandamentos do marketing pessoal ensinam especialistas na área é a aparência. Desleixo ao se vestir, ou deixar de se barbear diariamente, por exemplo, pode evidenciar displicência também ao realizar algum tipo de tarefa.
Mesmo que o barbado maltrapilho seja um gênio na área de atuação, um futuro contratante terá a impressão, mesmo subconsciente, de que o cidadão em questão é desleixado também no serviço.
"Você bate o carro e vai para uma entrevista de emprego com o veículo batido. Por que não alugar um outro e causar melhor impressão?", sugere Sady Bordin Filho.
Consultor de marketing e atualmente co-piloto de aviação comercial ? sim, ele também empregou as técnicas que ensina para mudar totalmente de carreira e realizar antigo sonho, aos 35 anos ? o curitibano, que atendeu à reportagem do Jornal da Cidade por telefone, é autor do livro "Marketing Pessoal ? 100 Dicas para Valorizar a sua Imagem" (Editora Record).
Neste guia, Bordin Filho elenca diversos quesitos, numa espécie de check-up, que a pessoa deve fazer antes de apresentar seu produto, no caso ela mesma.
Desde a preocupação com a saúde, até investimento em conhecimento, currículo, aparência e, um dos principais, a divulgação da marca através de gestos até simples (desejar bom dia a todos, exemplifica ele, desde o porteiro até o presidente da companhia), porém muitas vezes deixados de lado, ele receita até o planejamento e administração do sucesso alcançado.
Ainda de carona no exemplo do carro, Sady ilustra outra situação, envolvendo honestidade e consideração. No livro, ele cita a hipotética situação em que você tome emprestado o carro de alguém. Além de devolvê-lo, obviamente, o faça com o tanque cheio, ensina o autor.
Segundo ele, nenhum item do pacote deve ser colocado em primeiro ou último plano.
De nada adiantaria caprichar na aparência sem se preocupar com o conteúdo, observa ele. "Seria uma mesa com três pernas", ilustra, citando os quatro pilares do marketing pessoal: conteúdo, bagagem, atitude e comportamento.
Disciplina e etiqueta
No filme "Sem Limites" ("The Dark Fields"), o personagem Eddie Morra, vivido pelo ator Bradley Cooper, num passe de mágica, passa de escritor fracassado, maltrapilho e morador de um pardieiro para um alinhado vendedor de best-seller, milionário, organizado e bem sucedido nas especulações da bolsa de valores.
O milagre acontece após ele tomar um remédio, ainda não colocado no mercado, que potencializa a capacidade mental. Infelizmente, ou felizmente, não existe nenhum medicamento ou fórmula mágica para sermos ? e parecermos ? totalmente capazes de atingirmos o potencial máximo de nossas potencialidades.
O que existe, recomendam consultores, é a potencialização de nossos talentos, e da "embalagem" dos mesmos, através de muita disciplina. "O caminho certo é incorporar o marketing pessoal à sua maneira de ser, pessoal e profissional", recomenda o consultor organizacional Ari Lima.
De nada adianta, observa ele, ler um livro sobre o assunto na véspera de importante entrevista de emprego, tampouco esbanjar uma cultura ou competência que não se carreguem, de fato. "Agindo assim, provavelmente, os resultados serão duvidosos. O caminho certo é incorporar o marketing pessoal à sua maneira de ser pessoal e profissional. Incluir a preocupação com a carreira em todas as suas ações e relacionamentos", aconselha.
Dentro dessa linha, também é necessário traçar objetivos. A construção de bons relacionamentos deve ocorrer paralelamente ao aperfeiçoamento, para que o produto "vendido" seja cada vez melhor e com mais "recheio". "É necessário ter um plano de marketing, com estudo e formação acadêmica, aprender a vender sua imagem, conhecer seu mercado de trabalho, promover continuamente sua imagem dentro e fora da empresa, construir ao longo dos anos uma rede de relacionamentos", elenca Lima. "É importante criar uma marca pessoal", acentua.
E é justamente na falta de timbre que muitos profissionais mais pecam, observa Sady Bordin. "Profissional liberal utilizar email gratuito (hotmail, yahoo, gmail e afins) é de uma pobreza sem tamanho.
Ele cobra milhares de reais pelo serviço que presta mas não se preza a investir num email próprio", exemplifica o autor.