27 de dezembro de 2025
Geral

Sexo após casamento tem defensores

Ana Paula Pessoto
| Tempo de leitura: 6 min

Bem resolvido quanto à escolha de se manter virgem até o casamento, o estudante universitário Kaio, 19 anos, vê no sexo um presente para o casamento cujo embrulho deve ser aberto somente após o matrimônio. "Acho que o sexo é algo bom e legal, mas também acredito que os jovens, garotos e garotas, devem se guardar para a pessoa certa".

Virgindade ainda é um tabu para boa parte dos adolescentes e envolve questões como com quem, quando e onde ter a primeira relação sexual. Segundo dados de uma pesquisa sobre o comportamento sexual do brasileiro, divulgada pelo Ministério da Saúde em 2009, 36,9% dos homens e 17% das mulheres perdem a virgindade antes dos 15 anos de idade.

Em contraponto a esses números, cresce entre os jovens a bandeira a favor da virgindade até o casamento ou da prática do sexo apenas em relacionamentos estáveis. Para tanto, sites e redes sociais da Internet têm sido fonte de divulgação e debates.

Evangélico praticante, Kaio faz parte de algumas comunidades do Orkut que defendem a virgindade e diz que o seu modo de pensar tem muita relação com sua religião. Ele acredita que Deus destina uma pessoa para cada outra e que esperar isso acontecer é a coisa certa. "Aprendi isso desde criança".

Nos Estados Unidos a campanha também se destaca. É comum por lá o juramento religioso que promete o sexo somente após o casamento. Adolescentes famosos do cinema ou da música americana, como os irmãos Jonas Brothers, aderiram ao uso do anel "purity ring", ou anel da virgindade, símbolo do movimento.

Aos quase 20 anos, Kaio não teve uma namorada mas, embora a experiência não tenha sido aprovada, ele já "ficou". "Não estava com vontade de ficar com a menina. Foi um ato para mostrar para os outros. Acho que muita gente faz isso, mantém relacionamentos apenas por aparência ou para ser igual aos outros. Não acho isso correto, por isso quero esperar a hora e a pessoa certa", conta.

Apesar de se sentir bem com a escolha que fez, Kaio preferiu não divulgar seu nome ou imagem para se preservar de críticas ou até mesmo piadinhas, coisas que o universitário diz ouvir sem se importar: "Alguns dizem que não faço sexo por não gostar de mulher, e outras coisas do tipo. Tenho orgulho de ser virgem. Eu escolhi esperar o momento certo e me guardar para o casamento", afirma.

Ele também confessa que não sai por aí falando sobre sua virgindade, mas que não mede palavras para confirmar e explicar seus motivos quando alguém toca no assunto. E quanto à pessoa certa: "Se ela também for virgem, ficarei feliz, mas o que realmente importa é que ela tenha os mesmos valores e princípios que eu".


Na rede


A campanha "Eu Escolhi Esperar", voltada principalmente para jovens solteiros, é exemplo da corrente a favor da virgindade na Internet. Nelson Júnior é o idealizador e um dos coordenadores da mobilização. Ele afirma que o principal objetivo da campanha é fortalecer aqueles que fizeram a opção de esperar o casamento para inciarem suas vidas sexuais.

"Outro alvo é gerar em outros jovens o entendimento e a importância de se guardar para o casamento e lidar com sua sexualidade", acrescenta. Formado em teologia, Nelson trabalha há 20 anos com adolescentes e jovens e é pastor na cidade de Vitória, Espírito Santo. "Eu e minha esposa, Ângela, nos casamos virgens".

Em abril de 2011, o site www.euescolhiesperar.com deu origem a uma campanha nas redes sociais. Segundo o idealizador, hoje são mais 70 mil seguidores no Twitter, 130 mil no Facebook e outros 15 mil no Orkut. "A campanha se espalhou pela Internet. Achávamos que era a opção de uma minoria, mas vimos que essa é uma escolha de milhares".

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Por medo da imaturidade


As adolescentes Carla e Bruna (nomes fictícios), de 14 e 15 anos, respectivamente, acreditam que a adolescência não é a fase ideal para o início da vida sexual. "Acho terrível o fato de meninas da minha idade ou até mais novas transarem fora de um relacionamento sério. Muitas apenas ficam e já se entregam", opina Carla.

A garota se julga imatura para o sexo e diz não estar preparada para as possíveis responsabilidades da vida sexual. "Também tenho medo de engravidar. Acho que cada um tem sua hora certa. Não penso em me casar virgem, mas quero ter um relacionamento sério e me sentir madura e adulta para isso".

Já Bruna acredita que muitas meninas transam antes da hora para se sentirem populares e maduras, o que é um erro em sua opinião. Apesar de nunca ter namorado, a adolescente sonha em se casar virgem e acha que virgindade é uma questão de escolha e não uma imposição da sociedade como era antes.

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Regra social compromete
livre escolha, diz psicóloga

Se por um lado o ambiente familiar e religioso pode induzir à obrigação da virgindade, entre amigos e outros grupos sociais, um jovem pode se sentir na obrigação de fazer sexo para não parecer diferente dos demais. Em ambos os casos, segundo Daniela Aiello D?alkimin, psicóloga especialista em sexualidade e terapeuta cognitivo, o indivíduo fica comprometido em sua livre escolha e pode se sentir na obrigação de não fazer ou fazer.

Com a liberação sexual, principalmente depois da década de 1960 com o uso da pílula anticoncepcional, entre outros fatores, a não virgindade passou a ser uma regra imposta por outros grupos. "O sexo frequente passou a ser obrigação e não escolha, o que também se caracteriza como forma de repressão, a repressão do fazer. Isso explodiu em movimentos contra essa obrigação, a favor da virgindade e até mesmo em um movimento de pessoas que se dizem assexuadas", aponta Daniele.

Já o professor de ciências humanas José Rafael Mazzoni ressalta que, com a revolução sexual, hierarquias foram quebradas porque era proibido proibir e as pessoas adquiriram mais liberdade, ou acreditaram tê-la. "No caso da mulher, por exemplo, não ser virgem era algo desrespeitado pela sociedade antes da década de 60. Depois disso, o contrário passou a ser imposto como sinônimo de maturidade".

O professor acredita que a juventude tem se voltado para o espiritual e não está olhando apenas para o corpo. "A verdade é que nem todos têm vontade de transar apenas por prazer como foi colocado com a revolução sexual. Não é todo mundo que quer ter relações sexuais fora de um relacionamento fixo. Muitos têm realmente vontade de esperar até o casamento. E isso não deixou de existir na sociedade, mas agora quem pensa dessa forma não tem vergonha de expôr sua opinião. Acredito que o que está havendo é a quebra da imposição, seja como for, e o aumento da liberdade de opção de escolha".

Escolha


Segundo a psicóloga Daniela, o fato de movimentos a favor da virgindade "explodirem" nas redes sociais revela a busca de formas de validação de escolhas, já que não corresponder ao comportamento esperado pelos demais pode gerar sofrimento. "Eles procuram na Internet outras possibilidade de inclusão".

Independente da escolha, Daniele alerta que uma relação sexual escolhida livremente traz consequências positivas em termos de intimidade, cumplicidade e prazer. "Tal questão deve ser abordada entre pais e filhos com respeito pelas escolhas e também suas consequências negativas e positivas. Nenhuma regra que seja inflexível é uma boa regra, pois cada caso é um caso, cada situação e pessoa tem suas particularidades. Ao meu ver, a virgindade deve ser encarada assim, com flexibilidade".