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Douglas Reis |
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Alagamento na região do Vitória Régia em 2010 |
Basta chover forte para que a população ligue o alerta de perigo para a Nações Unidas. As enchentes e enxurradas atingem a região há anos e causam estragos no asfalto e calçadas, atrapalham o trânsito, danificam automóveis e causam até mesmo a morte de quem por ali se arrisca em perigosas tormentas.
Recentemente, um debate feito pelo poder público municipal, com a participação do Ministério Público (MP), resultou na decisão de interditar a Nações Unidas em momentos de risco, enquanto a cidade não obtiver êxito na liberação de recursos para executar obras de drenagem para a solução definitiva do problema. O objetivo é evitar novas tragédias e mortes causadas pelas enxurradas.
Antes da decisão, a interdição privilegiava as partes mais baixas da avenida, ou seja, a região do Terminal Rodoviário. Entretanto, conforme divulgou recentemente o JC, no dia 27 de maio uma chuva de poucos minutos foi suficiente para formar uma enxurrada de seis quilômetros que ultrapassou a altura do Parque Vitória Régia.
De olho nos transtornos causados pelo problema, a população tenta achar uma saída. Medidas emergenciais são apontadas para reduzir os riscos dessas tragédias anunciadas. Interdição da via, a construção de postos para infiltração, construção de barragens, piscinas e o alagamento do Parque Vitória Régia estão entre elas.
O JC ouviu dois engenheiros que propõem alternativas diferentes na busca definitiva pelo fim das enchentes nesta que é uma das principais vias da cidade. Para a engenheira ambiental Marcela Mattos de Almeida Bessa, uma das propostas possíveis é aumentar a quantidade de árvores com copa grande.
Para ela, a causa das enchentes e enxurradas se deve, principalmente, pela impermeabilização abusiva do solo que impossibilita a infiltração das águas das chuvas e aumenta a velocidade de escoamento superficial.
“Árvores frondosas são capazes de reter mais de 80% da chuva que cai sobre elas, além disso, auxiliam na recarga hídrica”.
Cisternas
Já para o engenheiro civil Luiz Felipe Santanna, a solução para essa “pedra no sapato” do bauruense é um problema que pode ter fácil solução e custo baixo. Ele acredita que uma das alternativas mais viáveis está na construção de duas grandes cisternas embaixo do viaduto da rede ferroviária.
“É claro que o projeto precisa ser melhor estudado e elaborado antes de ser colocado em prática, mas duas bombas em caracol poderiam ser posicionadas nas cisternas para jogar a água a quilômetros de distância. Uma tubulação também poderia ser feita até o Rio Bauru para despejar a água. Na parte de cima da Nações, uma tubulação pode ser colocada perto das sarjetas para não atrapalhar o trânsito”, destaca
Arborização planejada é proposta para minimizar enchentes
A causa das enchentes e enxurradas dos centros urbanos está, principalmente, na impermeabilização abusiva do solo, que impossibilita a infiltração das águas das chuvas e aumenta a velocidade de escoamento superficial, de acordo com a engenheira florestal da Secretaria Municipal do Meio Ambiente Marcela Mattos de Almeida Bessa. Uma das soluções para a questão pode estar na elaboração e prática de um projeto que vise a arborização planejada.
De acordo com ela, o mau uso dos fundos de vales e Áreas de Preservação Permanente (APP) também contribui para agravar o problema. “As medidas emergenciais devem ser adotadas sempre que a integridade da população estiver em risco, porque a gente trabalha com a melhoria de vida das pessoas. Por outro lado, é muito importante ressaltar que ações com resultados de médio ou longo prazo devem ser implantadas para atuar na causa dos problemas e contribuir para a sua solução em definitivo”, aponta.
Copas frondosas
Marcela Bessa explica que, com a impermeabilização abusiva do solo, não há outra saída para a água da chuva a não ser escorrer com força suficiente para danificar calçadas e asfalto, além de aumentar o volume de água e propiciar enchentes.
“Sabemos que as árvores frondosas são capazes de interceptar mais de 80% da chuva que cai sobre elas. Nos primeiros minutos, você pode notar que o asfalto fica seco sob essas árvores, e as gotas surgem a partir do momento em que elas vão se saturando. É como um travesseiro de espuma: você joga uma jarra de água sobre ele e demora até conseguir encharcar. Antes disso, ele libera apenas pingos de água. Então, por que não investir também em uma arborização que seja eficiente e bem monitorada?”, indaga.
Além de minimizar as inundações, a arborização planejada pode auxiliar na recarga hídrica por infiltração superficial e profunda no solo e ainda contribuir para a economia de dinheiro público, já que atua na conservação asfáltica, reduzindo a temperatura e a dilatação e contração que causa as trincas, garante a engenheira.
Como fazer?
Segundo Bessa, há estudos sendo realizados na cidade de São Paulo para determinar onde as árvores devem ser plantadas para captar de maneira mais eficiente a água da chuva, o que é chamado de interceptação.
O formato da copa também é importante, já que espécies com a copa e/ou a ramificação voltadas para cima têm maior potencial para fazer a recarga hídrica, isso porque as gotas tendem a escorrer pelo tronco e se depositar em canteiros.
“Há muitos estudos que apontam as frondosas sibipiruna e tipuana como excelentes espécies para a recarga hídrica por retenção de água da chuva. A sibipiruna aparece como uma das principais espécies em artigos científicos também por agir como um excelente filtro da poluição atmosférica e radiação solar”, acrescenta.
Custos
Cerca de 10 anos. Esse é o prazo estimado por Marcela Bessa para que a arborização planejada comece a surtir efeito sobre as enchentes na Nações Unidas. E, considerando que a ação está diretamente relacionada com o desejo da população, os custos de um projeto como esse podem ser muito variáveis.
“Se houver adesão da população com os cuidados com as árvores ou até mesmo com o plantio, o custo pode cair muito. O que a minha experiência e os artigos científicos têm demonstrado é que há sensibilização da população em relação aos custos e benefícios. Uma muda com um metro e cinquenta centímetros custa em torno de R$ 7 a R$ 15”, avalia.
Outro destaque desse tipo de projeto é o manejo adequado, necessidade básica para conduzir o crescimento da planta e a formação da copa, o que começa a acontecer a partir de 1,80 metro de altura.
“É possível elaborar e colocar o projeto em prática, mas deve-se trabalhar para a população, ou seja, não adianta a gente plantar se a população vai depredar. É preciso fazer um trabalho de conscientização. Sem o interesse da população, esses projetos se tornam inviáveis. Tudo depende, também, do auxílio da mídia e da universidade”, frisa.
Para engenheiro, obra sob viaduto é opção
O engenheiro civil Luiz Felipe Santanna trabalhou muitos anos com saneamento e acredita que uma das ações para solucionar em definitivo o problema das enchentes na avenida Nações Unidas está na canalização das águas da chuva ao longo da avenida e na construção de duas grandes cisternas com a capacidade de bombear essa água para o Rio Bauru.
Ele explica que a via está no fundo de um vale e as águas das avenidas e ruas da região se encontram nela, causando as enchentes e enxurradas. “Eu vejo os jornais diariamente e muito se fala sobre essa questão que, na minha visão, não é de difícil solução. A construção de um piscinão é inviável em minha opinião porque seria muito caro fazer uma obra subterrânea, e o valor dos imóveis que poderiam ser desapropriados é muito alto nessa região”, observa.
De acordo com Santanna, há um grotão ao lado do Parque Vitória Régia, mas um piscinão ali precisaria ser muito bem pensado, porque no local provavelmente há uma fonte de água natural. “Daria para fazer uma lagoa enorme no próprio parque, mas aí seria preciso danificar tudo o que já está construído lá”.
Tubulação e cisternas
O engenheiro destaca que a avenida em questão é a artéria principal da cidade, dessa forma, toda obra feita ali deve ser pensada com o intuito de não atrapalhar o seu funcionamento, ou intervir o menos possível no tráfego. “Por isso, a minha sugestão é construir uma tubulação na lateral da avenida, encostada nas sarjetas, para captar a água de toda a extensão que alaga, começando da parte de cima, e levá-la por baixo da terra até o viaduto da rede ferroviária”.
Sob o viaduto, onde a água fica parada, deveriam ser construídas duas grandes cisternas para captar essa água, segundo o engenheiro. Duas bombas caracol seriam colocadas e acionadas por dois motores com a finalidade de bombear a água para outra tubulação até o Rio Bauru, de preferência fora da área povoada. “As bombas devem ser dimensionadas, já que para cada problema existe uma solução na engenharia”.
Minhocão
Santanna lembra que um sistema parecido foi feito no Minhocão, em São Paulo, cuja dimensão é bem menor. Lá o projeto foi feito apenas para o viaduto não inundar. “Mas é tudo uma questão de sentar e colocar no papel a quantidade de água que cada setor da avenida capta. Os custos também precisam ser colocados na planilha e podem variar de acordo com o tipo de tubulação usada, o seu diâmetro, o valor do concreto para as cisternas, o seu tamanho, o tipo de bomba necessária... “É claro que teríamos de dimensionar tudo, mas é uma obra possível, sim. Cada engenheiro tem uma solução, mas é preciso colocar no papel e ver qual é a melhor, mais barata e a que cause menos transtorno para a cidade e para o meio ambiente. Precisamos tirar essa água da Nações, isso já é um problema histórico”, finaliza.