21 de dezembro de 2025
Economia & Negócios

Consertos voltam a atrair clientes na crise e se tornam uma alternativa

Cinthia Milanez
| Tempo de leitura: 4 min

Alex Mita
O setor de reparos de peças de roupas está se dando bem com a retração, mas os clientes têm de ter paciência, porque a demanda é muito grande e a entrega pode demorar

Fazer uns ajustes em uma peça de roupa já “batida” ou recuperar um sapato desgastado são as soluções encontradas por diversos bauruenses para enfrentar a retração econômica vivenciada pelo País. Segmentos que antes ficavam “às moscas” retornaram ao auge. A procura é tamanha que  alguns estabelecimentos do setor têm dificuldades para atender uma demanda tão inesperada.

Este é o caso do sapateiro Manoel Cirino Neto, 65 anos, que mantém um espaço simples e com um forte cheiro de couro “novinho em folha” na rua Gerson França, na região central de Bauru, há 42 anos. De lá para cá, muita coisa mudou. Contudo, o que mais chamou a atenção do trabalhador foi o aumento considerável da procura pelo serviço. Ele calcula que a demanda tenha crescido 30% neste inverno em comparação com o mesmo período do ano anterior.

Inclusive, Cirino não dá conta de recuperar os sapatos em tempo hábil. “Só consigo em 20 dias, mesmo trabalhando aos sábados até as 18h”, revela. O sapateiro, que também conserta bolsas, já recebe, em média, 70 clientes por dia. Por outro lado, o trabalhador não tem do que reclamar, porque o faturamento mensal de Cirino supera o salário oferecido aos engenheiros em concurso aberto recentemente pelo Departamento de Água e Esgoto (DAE).

Além disso, o sapateiro atribui o aumento significativo do movimento à crise econômica. “Hoje, um calçado de qualidade custa em torno de R$ 200,00. Os clientes que pagaram um preço mais alto no item há algum tempo não gastarão esta quantia, principalmente porque a recuperação de um sapato varia de R$ 10,00 a R$ 80,00”, argumenta. Para ele, a profissão está tão lucrativa nos últimos meses quanto na década de 70, quando alcançou o auge.

O porteiro Fabiano Pereira de Souza, 35 anos, é um exemplo de consumidor que quer “aliviar” o bolso neste momento. Em frente a uma loja de conserto de peças de roupas, com uma jaqueta em mãos, ele queria trocar o zíper, que havia quebrado. “Paguei R$ 190,00 nesta blusa há alguns anos e ao invés de comprar outra, optei por gastar R$ 15,00 no conserto”, defende.

DOIS REFLEXOS

Uma franquia que trabalha com tingimento industrial, conserto e lavagem de roupas, que fica entre as ruas Antônio Alves e Bandeirantes, no Centro, apresentou, dependendo do serviço, queda e aumento de clientes nos últimos seis meses deste ano em relação ao mesmo período de 2014.

O franqueado Pedro de Paula Ferreira, 62 anos, conta que a procura por tingimento e conserto de roupas aumentou aproximadamente 15%. Em contrapartida, a a lavanderia alcançou uma redução de quase 30%.

“Uma calça jeans custa, em média, R$ 100,00, mas o tingimento de uma peça mais desgastada, que a torna nova, é R$ 32,00. Já os consertos das peças variam de R$ 13,00 a R$ 20,00. Recuperar uma roupa é mais barato que adquirir uma nova. Por outro lado, para economizar, as pessoas optam por lavar as roupas em casa”, pontua. O prazo de entrega dos itens é de cinco dias, mas, no caso dos consertos, varia de acordo com a urgência dos consumidores.

Alex Mita
Pedro de Paula Ferreira, 62 anos, conta que a procura por tingimento e conserto de roupas aumentou cerca de 15%

Cliente de Ferreira há anos, a ajudante geral Ana Paula Cosmo, 40 anos, informa que nunca abriu mão de economizar, mesmo em tempos menos difíceis. À franquia, ela levou a calça da filha, que havia manchado, para recuperar.

Por outro lado: mais devedores

A proprietária de um estabelecimento comercial destinado ao conserto de eletrodomésticos, desde ferros elétricos até micro-ondas, acredita que a crise ajudou a aumentar a demanda, mas a rapidez na entrega dos equipamentos recuperados fez com que a carteira de clientes crescesse. Desde 1964 em um espaço localizado na rua Antônio Alves, no Centro, Vera Lúcia Quercio da Silva, 66 anos, tem experiência na área. Enquanto o marido realiza os consertos, ela atende quatro gerações de clientes.

Todavia, a retração econômica também trouxe mais clientes inadimplentes. “Em casa, há dois cômodos repletos de eletrodomésticos recuperados que as pessoas não vieram buscar e não posso vender, porque, pelo Código de Defesa do Consumidor, tenho de esperar dois anos após o suposto abandono”, finaliza a comerciante.

‘É preciso saber usar muito bem o dinheiro hoje’

João Rosan/Arquivo
Mauro Gallo dá dicas a quem, mesmo na crise, vai consumir 

O economista Mauro Gallo traz à tona uma máxima que defende que as pessoas não precisam deixar de comprar, mas têm de saber usar bem o dinheiro. Assim, ele confirma que, em tempos difíceis, a tendência é de que alguns serviços sejam mais procurados. “O Brasil, ao contrário da Europa e dos EUA, possui mão-de-obra relativamente barata e, mesmo que os preços dos serviços subam por conta da demanda, as pessoas vão optar pela economia”, explica.

Assim, o economista aconselha a não comprar por impulso, fazer pesquisa e evitar se comprometer com prazos longos e juros pesados, além de fugir do cheque especial.

Para os já estão endividados, a dica é fazer uma “troca”. “Os juros mensais dos cartões e cheques especiais são de 10% a 12%. As pessoas podem fazer um empréstimo no banco, cujos juros não passam de 4,5% ao mês, para quitar as dívidas. Esta é uma forma de enfrentar a crise”.