24 de dezembro de 2025
Entrevista da semana

Coração e garra dentro e fora das quadras

Bruno Freitas
| Tempo de leitura: 5 min

Garra e coração. Assim é Suelle do Prado Oliveira, dentro e fora das quadras. De origem humilde, batalhou muito para chegar onde chegou e, hoje, é uma das principais jogadoras do Sesi Vôlei Bauru. A família, notadamente, é seu grande e maior orgulho. "Fiz tudo por ela", garante.

Inclusive, a trajetória no vôlei nasceu em casa. O sonho (hoje) realizado de ser jogadora da modalidade não era nem de longe a sua escolha como profissão. Esse era o desejo da sua irmã mais velha.

Suelle e os irmãos Damaris, Pedro, José Paulo e Rodrigo foram criados pela mãe Irani Franco do Prado, que sustentou sozinha o quinteto por muitos anos. Os irmãos cresceram tendo apenas o básico, tanto para comer quanto para vestir, mas a união os fortaleceu para superar as dificuldades, recorda Suelle, que chegou a vender biscoitos em semáforo nas férias escolares. Inclusive, os primeiros ganhos dela com o vôlei foram direcionados para ajudar a manter os gastos da casa.

Hoje, ela ostenta um currículo que soma títulos e experiências no Exterior e na Seleção Brasileira. E bate um bolão não só na rede, mas também nas redes. Tem quase 100 mil seguidores no Instagram e conquista fãs do Brasil inteiro, seja falando do esporte, com belas fotos, vídeos criativos e até dancinhas divertidas. Natural de Curitiba (PR), a ponteira de 34 anos e 1,86 metro falou ao JC sobre a infância difícil, a luta diária para conseguir ser uma atleta de alto rendimento e os planos para quando parar de jogar. Confira a seguir:

 Jornal da Cidade - Como foi a infância?

Suelle - Desde os 9 anos eu sempre era a mais alta da turma. E sempre recebia diversos apelidos na escola, por ser a "diferente". Me achava estranha. E foi aos 9 que a minha irmã me levou para fazer teste no Projeto Rexona, do Bernardinho. Fui chorando. Eu não queria, mas fui. Jogar vôlei foi algo totalmente contra a minha vontade, no início. Mas como eu estava me destacando, segui o plano da minha irmã. Aos 12 anos fui "Federada" pela primeira vez e aos 13 anos fiz a minha primeira viagem internacional para disputar um torneio no Chile. Precisamos fazer rifa para o custeio.

Jornal da Cidade - Quando foi que parou de ir chorando treinar e passou a ver o vôlei como profissão?

Suelle - Quando recebi meu primeiro salário (mínimo) e fui convocada pela primeira vez para a base da seleção, aos 16. Reparei que iria fazer algo diferente para ajudar a minha família. Gostei. Tudo o que eu recebia era para ajudar a minha mãe e meus irmãos.

Jornal da Cidade - E quando comprou algo só para você?

Suelle - Com 16 anos me dei de presente o primeiro celular. Comprei por causa da cor e da luz azul. Nem sabia se era bom. Chorei igual criança.

Jornal da Cidade - Como foi a profissionalização?

Suelle - Foi difícil. Aos 17 convenci minha mãe que precisava sair de casa e ir morar em São Caetano. Fui para ganhar uma bolsa menor do que o mínimo. Um passo atrás, para dar dois à frente, depois. Eu ligava a cobrar na casa do vizinho da minha mãe para poder falar com ela. Mandava metade da minha bolsa mensal de R$ 300,00 para ela. Eu ainda morava com diversas outras meninas. A comida não dava para todas. Fazia uma refeição por dia e treinava. Foi quando tive anemia e quase desisti. Mas as coisas melhoraram, passei a receber R$ 1.000,00 e comemorei: "estou rica" (risos). E foi por lá que disputei minha primeira Superliga.

Jornal da Cidade - Se sente realizada nas quadras?

Suelle - Sim! Joguei pelo Osasco em um time forte entre 2007 a 2009, que me deu visibilidade. No Brusque fui titular e protagonista. O clube me abriu portas e fui para o Rio de Janeiro, trabalhar com o Bernardinho. Foi um divisor de águas para mim. Cheguei como atleta respeitada. Em 2008, fui convocada pela primeira vez para a seleção principal, depois joguei no Praia e no Sesi-SP tive o auge, mas também minhas primeiras lesões no ombro (direito). Pelo Sesi-SP fui bronze no Mundial de Clubes de 2014 e fui eleita a melhor ponteira da competição. Depois voltei para o Osasco, fui convocada novamente para a seleção e disputei pré-olímpico e Grand Prix. Depois joguei no Pinheiros e participei de um projeto incrível do Barueri, com o José Roberto Guimarães, onde fomos campeãs da Superliga C, B e disputamos a A. E no Japão, tive uma das minhas melhores experiências, de organização e de vôlei também. E hoje (em Bauru), com a experiência que eu tenho, nunca senti tanto prazer em jogar vôlei. Tenho uma profissão instável, de carreira curta, que lesiona muito e há a pressão de jogar bem sempre. A maioria das atletas prioriza a parte física, mas eu também foco na mente. Todas as jogadoras deveriam fazer terapia.

Jornal da Cidade - Como se vê após o vôlei?

Suelle - Ainda não defini com o que vou trabalhar. Estou quase batendo os 100 mil no Instagram e gosto muito dessa área de rede social e comunicação. Falo muito com a Fabi (ex-líbero e comentarista de TV) e penso, talvez, em trabalhar comentando jogos também. Quero ter meu cantinho perto de alguma praia e iniciar um projeto social de inteligência emocional para ajudar pessoas. Fui casada por cinco anos, mas, mesmo solteira, ainda bate forte em mim o sonho de ser mãe. Não importa quando, mas é algo que eu desejo há muito tempo. Vai acontecer na hora certa.