'Dengue vai dar surpresas', afirma membro da Opas no Brasil
Ao menos no Brasil, 2024 ficará marcado como um ano trágico na série histórica da dengue. Foram registrados cerca de 6,5 milhões de casos prováveis, perto de 6 milhões confirmados e 6.321 mortes, segundo o painel de arboviroses do Ministério da Saúde.
Em 2025, apesar dos altos números, a intensidade da doença está menor. De janeiro a 20 de setembro houve cerca de 1,6 milhão de casos prováveis, 1,3 milhão confirmados e 1.650 óbitos, contra 6,4 milhões, 5,9 milhões e 6.204, respectivamente, no mesmo período do ano passado.
Historicamente, era esperado que epidemias de dengue ocorressem a cada quatro anos nas Américas. Porém, desde 2022 a transmissão tem se tornado mais intensa. E as mudanças climáticas têm grande responsabilidade pelo cenário.
"Eventos climáticos extremos, ondas de calor, enchentes e secas vão se repetir de um jeito muito mais frequente do que nós conhecíamos nos últimos anos. Uma das coisas que temos visto com a mudança climática, em geral nas Américas, no mundo todo, mas se nos referimos à América do Sul, em particular, é uma expansão dos hábitos que são propícios a alguns vetores, como o Aedes aegypti, transmissor da dengue, zika e chikungunya", afirma Cristian Morales Fuhrimann, representante da Opas/OMS (Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde) no Brasil.
"No ano passado vimos de um jeito muito dramático como cantos do Brasil que antes não tinham dengue, agora tem. Foi o que ocorreu em Porto Alegre depois das enchentes. Se olharmos para a frente, num futuro próximo, a tendência deveria ser uma diminuição do impacto da dengue, em especial, no Brasil, por causa do ciclo de quatro anos. A Dengue vai dar surpresas. É algo que eu quero enfatizar", diz Cristian Morales.
Pela lógica, 2026 deveria ter incidência menor da doença, mas não é possível prever como ela se comportará. "As epidemias têm composição multifatorial e esses fatores estão mudando rapidamente também. E temos os eventos climáticos extremos que antes não tínhamos. Então, como vai nos afetar e se o ciclo será mais rápido, não sabemos", diz Morales
Morales conversou com a reportagem na terça-feira (23) no Seminário Internacional Desafios da Saúde nas Megacidades, organizado pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, em parceria com a Opas.
O evento, realizado no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, na Bela Vista, região central de São Paulo, reuniu especialistas de oito países -Brasil, Colômbia, Peru, Argentina, Chile, México, Estados Unidos e Canadá- para discutir soluções digitais e inclusivas para fortalecer os sistemas de saúde em grandes centros urbanos.
Na ocasião, o representante da Opas ressaltou a importância de discutir o assunto no momento em que os olhares estão voltados para a COP30, que será realizada em Belém, em novembro.
"O dia da saúde na COP 30, 13 de novembro, será o epicentro da discussão, em particular, do plano de ação de mudança climática e saúde. A discussão vai trazer os cientistas mais importantes, mas também os tomadores de decisão, que têm que não somente aprovar o plano de mudança climática e saúde, mas implementá-lo. Planos temos demais. O que falta, às vezes, é a implementação na realidade de todos os dias", afirma.
De acordo com Cristian, é o momento de preparar os serviços e os profissionais de saúde do primeiro nível de cuidados a identificar os fatores de risco que fazem da dengue uma doença, às vezes, fatal. A Opas colabora com o Ministério da Saúde na formação e no treinamento do pessoal da saúde.
"Temos curso para reforçar as equipes que estão na ponta, precisam conhecer os sinais de alerta de dengue grave e aplicar as medidas adequadas. A outra coisa -e aqui o Instituto Butantan é muito importante- é o desenvolvimento da vacina da dengue. Ela é muito inovadora protege mais de 80% contra os quatro sorotipos de dengue e isso vai fazer uma grande diferença entre a capacidade que temos hoje no sistema de saúde, não somente no Brasil, mas também nas Américas", finaliza.
A vacina utilizada atualmente no país é a Qdenga. Fabricada pela farmacêutica Takeda, é ofertada a crianças e adolescentes com idades de 10 a 14 anos.
Quem apresentar febre alta (38°C a 40°C) de início repentino e pelo menos duas manifestações ?dor de cabeça, prostração, dores musculares e/ou articulares e dor atrás nos olhos? deve procurar uma unidade de saúde.
Passada a fase crítica, a maioria se recupera. Em alguns casos, a doença pode progredir para formas graves e óbito.
Os sinais de alarme para a gravidade são dor abdominal intensa e contínua, vômitos persistentes, acúmulo de líquidos em cavidades corporais (ascite, derrame pleural, derrame pericárdico),
hipotensão postural (queda da pressão arterial ao levantar-se da posição sentada ou deitada), sensação de desmaio, letargia e/ou irritabilidade, aumento do tamanho do fígado, sangramento de mucosa e aumento progressivo do hematócrito.