BEM ESTAR & CIA

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Elas estão sobrecarregadas, estressadas e insatisfeitas

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86% das brasileiras consideram ter muita carga de responsabilidade

86% das brasileiras consideram ter muita carga de responsabilidade

Por Fernanda Mena | 05/11/2023 | Tempo de leitura: 4 min

Por Fernanda Mena
05/11/2023 - Tempo de leitura: 4 min

Freepik

A sobrecarga de trabalho, dentro e fora de casa tem impactado a saúde emocional das mulheres brasileiras, aponta estudo

Foi nos corredores de um supermercado, com uma filha no carrinho, outra ao lado, a cabeça na lista de compras e de tarefas, e o celular na mão, lotado de mensagens de trabalho, que Vera Nunes de Santana, 46, simplesmente "bugou". "Eu apaguei. Fiquei paralisada. Precisaram chamar o gerente do mercado para me ajudar e, de lá, fui para o hospital", conta ela. A curadora e produtora cultural saiu com uma guia médica que recomendava, por ora, apenas descanso. Vera estava esgotada.

Ela não está sozinha. Estudos internacionais apontam que a prevalência de esgotamento mental, também conhecido como síndrome de burnout, é 25% maior entre as mulheres. A sobrecarga de trabalho, dentro e fora de casa, a pressão financeira e o desafio de conciliar múltiplas tarefas e a rotina de cuidados com crianças e idosos estão entre os fatores que mais têm impactado a saúde emocional de mulheres brasileiras, segundo o relatório "Esgotadas", da ONG Think Olga.

De acordo com o documento, 86% das brasileiras consideram ter muita carga de responsabilidade, e 48% sofrem com uma situação financeira apertada, num contexto em que 28% se declaram como única ou principal provedora de seu lar e que 57% daquelas entre 36 a 55 anos são responsáveis pelo cuidado direto de alguém.

A pesquisa entrevistou 1.078 mulheres de 18 a 65 anos de todo o país e aponta que metade das brasileiras se sente ansiosa (55%) e estressada (49%), mas também irritada (39%), exausta (28%), com baixa autoestima (28%) e triste (25%). Além disso, 45% já tiveram diagnóstico de ansiedade, depressão ou outros transtornos mentais, segundo o estudo. E 68% fez algum acompanhamento médico.

O desemprego, que atinge mais mulheres que homens no Brasil (10,8% contra 7,2% entre homens), e o processo de feminização da pobreza deram urgência às pressões financeiras, apontadas pelo estudo da Think Olga como a principal fonte de insatisfação e sofrimento para mulheres brasileiras.

Entre mulheres negras, que são maioria entre as chefes de família, entre as mães solo e entre as desempregadas, a situação é ainda mais grave. Não à toa, mais mulheres negras (54%) do que brancas (39%) disseram estar insatisfeitas com sua situação financeira.

"Neste contexto, a questão do cuidado fica muito mais difícil porque não é possível contratar alguém para essa tarefa, e a pressão aumenta, enquanto a maioria das mulheres brancas e de classe média alta podem pagar por uma rede de apoio para os cuidados com crianças e pessoas idosas", avalia Nana Lima, diretora do Think Olga.

Para a psiquiatra clínica e psicanalista Juliana Belo Diniz, o bem-estar das mulheres está atravessado por questões sociais, culturais e históricas que não serão resolvidas apenas com políticas públicas de saúde mental.

Outros estudos já apontaram que a saúde mental feminina está mais pressionada do que a masculina. A taxa de mulheres brasileiras que já tiveram diagnóstico de ansiedade (27%) e depressão (20%) é o dobro da registrada entre os homens (14% e 10%, respectivamente), segundo pesquisa Datafolha recente.

Mesmo em relação aos dados globais, as mulheres do Brasil aparecem com saúde mental mais comprometida. Enquanto a taxa de homens brasileiros com transtornos mentais ou por uso de substância é 21% maior que a taxa masculina global, entre as brasileiras ela é 42% mais alta que a média feminina no mundo.

Durante a pandemia, a situação se agravou, e mulheres representaram 67% dos novos casos de transtorno depressivo e 68% dos novos casos de transtorno de ansiedade em 2020, segundo estudo publicado na revista Lancet.

As mulheres que procuram seu consultório, afirma, muitas vezes estão em busca de ajuda porque querem continuar aguentando essa sobrecarga. “Elas acham que precisam segurar as pontas até o final porque são a última fonte de resistência da estrutura familiar”, explica.

O desequilíbrio entre homens e mulheres na divisão do trabalho doméstico e parental e nos cuidados com outras pessoas é um dos fatores que pressiona desproporcionalmente as mulheres. Elas dedicam, em média, 21,4 horas semanais às tarefas domésticas enquanto eles, quase a metade disso (11 horas).

A sobrecarga de trabalho doméstico e a jornada excessiva de trabalho foi a segunda causa de descontentamento mais apontada por mulheres na pesquisa do Think Olga.

“Os resultados da pesquisa reforçaram o que já sabemos sobre a exaustão das mulheres e o trabalho feminino, e sua dupla ou tripla jornada. É tanta ansiedade, que o corpo pifa”, afirma Jaqueline Gomes de Jesus, professora de psicologia do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ).

“Sob um ideário de heroína, mulheres acumulam o trabalho fora de casa, em que ganham menos do que os homens, com as tarefas domésticas, que não são reconhecidas como trabalho e, portanto, não são remuneradas.”

Outros fatores apontados como causa de sofrimento pelas brasileiras foram a pressão estética (26%), a pressão familiar ou da comunidade para que façam algo que não querem (21%), o machismo (21%) e o medo de sofrer violência (16%).

Para Nana Lima, diretora do Think Olga, a pesquisa mostra que “os fatores estão interconectados e vão se acumulando sobre as mulheres, gerando uma insatisfação feminina muito alta”. A solução, diz, passa por políticas públicas que enfrentem as causas da sobrecarga e do sofrimento das mulheres. “Que tipo de sociedade nós estamos construindo quando as mulheres estão tão abaladas e desesperançosas?”.

Foi nos corredores de um supermercado, com uma filha no carrinho, outra ao lado, a cabeça na lista de compras e de tarefas, e o celular na mão, lotado de mensagens de trabalho, que Vera Nunes de Santana, 46, simplesmente "bugou". "Eu apaguei. Fiquei paralisada. Precisaram chamar o gerente do mercado para me ajudar e, de lá, fui para o hospital", conta ela. A curadora e produtora cultural saiu com uma guia médica que recomendava, por ora, apenas descanso. Vera estava esgotada.

Ela não está sozinha. Estudos internacionais apontam que a prevalência de esgotamento mental, também conhecido como síndrome de burnout, é 25% maior entre as mulheres. A sobrecarga de trabalho, dentro e fora de casa, a pressão financeira e o desafio de conciliar múltiplas tarefas e a rotina de cuidados com crianças e idosos estão entre os fatores que mais têm impactado a saúde emocional de mulheres brasileiras, segundo o relatório "Esgotadas", da ONG Think Olga.

De acordo com o documento, 86% das brasileiras consideram ter muita carga de responsabilidade, e 48% sofrem com uma situação financeira apertada, num contexto em que 28% se declaram como única ou principal provedora de seu lar e que 57% daquelas entre 36 a 55 anos são responsáveis pelo cuidado direto de alguém.

A pesquisa entrevistou 1.078 mulheres de 18 a 65 anos de todo o país e aponta que metade das brasileiras se sente ansiosa (55%) e estressada (49%), mas também irritada (39%), exausta (28%), com baixa autoestima (28%) e triste (25%). Além disso, 45% já tiveram diagnóstico de ansiedade, depressão ou outros transtornos mentais, segundo o estudo. E 68% fez algum acompanhamento médico.

O desemprego, que atinge mais mulheres que homens no Brasil (10,8% contra 7,2% entre homens), e o processo de feminização da pobreza deram urgência às pressões financeiras, apontadas pelo estudo da Think Olga como a principal fonte de insatisfação e sofrimento para mulheres brasileiras.

Entre mulheres negras, que são maioria entre as chefes de família, entre as mães solo e entre as desempregadas, a situação é ainda mais grave. Não à toa, mais mulheres negras (54%) do que brancas (39%) disseram estar insatisfeitas com sua situação financeira.

"Neste contexto, a questão do cuidado fica muito mais difícil porque não é possível contratar alguém para essa tarefa, e a pressão aumenta, enquanto a maioria das mulheres brancas e de classe média alta podem pagar por uma rede de apoio para os cuidados com crianças e pessoas idosas", avalia Nana Lima, diretora do Think Olga.

Para a psiquiatra clínica e psicanalista Juliana Belo Diniz, o bem-estar das mulheres está atravessado por questões sociais, culturais e históricas que não serão resolvidas apenas com políticas públicas de saúde mental.

Outros estudos já apontaram que a saúde mental feminina está mais pressionada do que a masculina. A taxa de mulheres brasileiras que já tiveram diagnóstico de ansiedade (27%) e depressão (20%) é o dobro da registrada entre os homens (14% e 10%, respectivamente), segundo pesquisa Datafolha recente.

Mesmo em relação aos dados globais, as mulheres do Brasil aparecem com saúde mental mais comprometida. Enquanto a taxa de homens brasileiros com transtornos mentais ou por uso de substância é 21% maior que a taxa masculina global, entre as brasileiras ela é 42% mais alta que a média feminina no mundo.

Durante a pandemia, a situação se agravou, e mulheres representaram 67% dos novos casos de transtorno depressivo e 68% dos novos casos de transtorno de ansiedade em 2020, segundo estudo publicado na revista Lancet.

As mulheres que procuram seu consultório, afirma, muitas vezes estão em busca de ajuda porque querem continuar aguentando essa sobrecarga. “Elas acham que precisam segurar as pontas até o final porque são a última fonte de resistência da estrutura familiar”, explica.

O desequilíbrio entre homens e mulheres na divisão do trabalho doméstico e parental e nos cuidados com outras pessoas é um dos fatores que pressiona desproporcionalmente as mulheres. Elas dedicam, em média, 21,4 horas semanais às tarefas domésticas enquanto eles, quase a metade disso (11 horas).

A sobrecarga de trabalho doméstico e a jornada excessiva de trabalho foi a segunda causa de descontentamento mais apontada por mulheres na pesquisa do Think Olga.

“Os resultados da pesquisa reforçaram o que já sabemos sobre a exaustão das mulheres e o trabalho feminino, e sua dupla ou tripla jornada. É tanta ansiedade, que o corpo pifa”, afirma Jaqueline Gomes de Jesus, professora de psicologia do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ).

“Sob um ideário de heroína, mulheres acumulam o trabalho fora de casa, em que ganham menos do que os homens, com as tarefas domésticas, que não são reconhecidas como trabalho e, portanto, não são remuneradas.”

Outros fatores apontados como causa de sofrimento pelas brasileiras foram a pressão estética (26%), a pressão familiar ou da comunidade para que façam algo que não querem (21%), o machismo (21%) e o medo de sofrer violência (16%).

Para Nana Lima, diretora do Think Olga, a pesquisa mostra que “os fatores estão interconectados e vão se acumulando sobre as mulheres, gerando uma insatisfação feminina muito alta”. A solução, diz, passa por políticas públicas que enfrentem as causas da sobrecarga e do sofrimento das mulheres. “Que tipo de sociedade nós estamos construindo quando as mulheres estão tão abaladas e desesperançosas?”.

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1 COMENTÁRIOS

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  • Kayak
    05/11/2023
    Só jogar tudo pra cima e começar de novo! Os homens em nossa sociedade machista, só intensificam essa sensação, pois são muito bons em cobrar as mulheres, mas não lavam nem o copo que se bebe água. A educação masculina e a divisão de tarefas tem que mudar. Ou então vai pagar a terceiros pra eles fazerem tudo, mas pra isso, tem que ter dinheiro!