É cada vez mais difícil resistir às investidas do marketing em um mundo de consumo facilitado pela internet, mas se as compras por impulso se repetem muitas vezes e, de alguma maneira trazem prejuízos a quem as faz, é necessário procurar tratamento. Assim como outros transtornos, a compulsão por comprar é preocupante e pode afetar de diversas maneiras o cotidiano de quem sofre com a condição.
A funcionária pública Ana Carolina de Toledo Prado, de 28 anos, diz que as compras já são tema na terapia psicológica. "Sou de Rondônia e moro há aproximadamente seis anos em Santa Catarina. Eu sempre comprei bastante em sites estrangeiros, principalmente no Aliexpress, por volta de 2012, porque o frete para Rondônia era muito caro nas lojas nacionais. Quando eu me mudei para Santa Catarina, as compras ficaram mais 'acessíveis', principalmente por conta do frete grátis, e aí que me perdi, todo dia chegava encomenda.”
“Eu amo maquiagem e acabei criando pequenas coleções. Então, comecei a levar esse assunto para terapia. Quando vi que ficava muito fissurada em um produto, comprava vários do mesmo, mas logo isso passava. E era um ciclo, pois passava um tempo e eu estava fissurada em outras coisas", comenta.
Ana Carolina já se arrependeu de diversas compras, inclusive logo depois de comprar, recorrendo ao cancelamento, mas costuma se planejar financeiramente. "As compras nunca me prejudicaram financeiramente, pois nessa parte eu me controlo bem. Se eu realmente não posso comprar, eu me seguro e não compro. Mas eu sempre deixava anotado para comprar quando pudesse, inclusive parei de fazer isso, pois vi que era algo momentâneo e logo já esquecia daquilo. Quando compro, fico ansiosa, sempre olhando o rastreio, e quando recebo uma encomenda, a sensação é que me mandaram um presente e eu vou abrir toda eufórica, mas na verdade eu mesma que paguei."
Em datas de promoções maiores, como a Black Friday, e também agora, nos últimos dias antes de começar a taxação para compras internacionais de até US$ 50, ela costuma comprar mais. “Aproveito promoções. Quando saiu o anúncio da taxação, acabei fazendo cinco compras internacionais em um mês, praticamente. Fora as outras compras que faço em promoções em lojas brasileiras. Participo de mais de 10 grupos com promoções, e muitas vezes preciso silenciar para não cair na tentação."
Quando precisa de atenção?
Psicóloga especializada em terapia cognitivo comportamental, Ana Maria Sanches diz que a compra compulsiva é feita em episódios de impulso, ao contrário da compra normal, que é planejada e necessária. “A compra compulsiva ou oniomania - em que ‘one’ é ‘comprar’ e ‘mania’ é ‘loucura’ - é caracterizada como um Transtorno do Controle do Impulso, onde a característica principal é a falha em resistir a um impulso ou desejo de realizar um ato que é prejudicial ao indivíduo ou a outras pessoas. Os critérios diagnósticos da oniomania são preocupação excessiva e perda de controle sobre o ato de comprar, sendo um impulso irresistível, intrusivo e sem sentido.”
A especialista explica que muitas vezes, assim como em outras compulsões, há um arrependimento imediato. “Comprar além do que se pode pagar, comprar itens desnecessários, comprar por períodos maiores do que o pretendido. Há preocupação com compras e os impulsos ou o ato de comprar causam sofrimento intenso. Mas a compra compulsiva não ocorre exclusivamente durante episódios de hipomania ou mania. Para o comprador compulsivo, as compras podem ser interpretadas como uma recompensa, um prazer imediato, que na grande maioria das vezes traz um enorme arrependimento depois. Este arrependimento pode vir logo após o ato da compra.”
A profissional, que integra o Programa Ambulatorial Integrado dos Transtornos do Impulso, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, diz que “os compradores compulsivos podem ter outras comorbidades associadas, como transtorno de ansiedade, e outros transtornos, como bipolaridade e transtorno obsessivo compulsivo”. Ela lembra que há atendimento gratuito e on-line pelo programa (https://www.proamiti.com.br/).