16 de julho de 2024
CRÔNICA

Toshio do Pacaembú

Por Jeremias Alves Pereira Filho | Especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 3 min

O Bar Pacaembú, que nem era “bar”, tinha esse nome. Aliás, só o Toshio devia saber porque assim se chamava. Creio que a rapaziada que o frequentava no final dos anos 1960, na sua sede na praça Rui Barbosa, quase esquina com a Prudente de Moraes,  talvez imaginasse que teria a ver com o famoso Estádio do Pacaembú, na Capital, depois da Copa do Mundo de Futebol, recentemente vencida pelo Brasil por inesquecíveis 5 a 2 contra a Suécia, dona da casa, assombrada pelo moleque Pelé, de apenas 17 anos e dono de um futebol secular. O estádio, por esse triunfo então inédito da chamada “seleção canarinho”, recebeu o nome do Paulo Machado de Carvalho, manda-chuva da TV Record e também homenageado com o título de Marechal da Vitória, acumulado como dirigente Campeão Mundial. Bastante razoável...

Outra possibilidade podia ser que o Toshio e familiares tivessem migrado de Pacaembú, município no interior do estado de São Pauloe acolhedor de uma das maiores colônias japonesas da época. Assim, Toshio, corretamente, quis homenagear a primeira cidade que os acolheu, dando-lhe o mesmo nome ao estabelecimento comercial recém aberto e para o qual dedicou corpo e alma.

O comando dos pedidos e preparo dos sanduíches era do titular Toshio, secundado por seu mano Tião (pode um autêntico japonês chamar Tião?), além de uns patrícios e outros bons e competentes auxiliares locais. Conheciam os fregueses pelo nome e gosto e os atendiam antes mesmo de se acomodarem nas banquetas junto ao balcão que dava a volta na área de trabalho. Como disse, não era verdadeiramente um bar, porque todos – todos – iam para lá afim de traçar o espetacular lanche “Paulista”. Rabo-de-Galo e cerveja gelada eram opções, entre guaraná Caçulinha ou Maçãzinha ou, ainda, grapa de cana de açúcar, minha preferida.

Consistia o sanduiche num simples e fresquíssimo pão francês, chegado quase de hora em hora da Padaria Floresta, dada à enorme “saída”, recheado com fatia de queijo prato sobre bife de alcatra, bem fininho e pincelado com o molho secreto do Toshio, depois de abafado na chapa por reles tampa de frigideira. Pincelado sim, porque o grande chapeador campeão do mundo usava mesmo um pincel desses de pintor de parede, vendido em qualquer boa casa do ramo, untado com o caldo de especiarias. Servido instantaneamente e crocante num pratinho de porcelana branca, que o Toshio colocava no balcão na cara do freguês. Nem precisava anotar pedido, tamanha solicitação, e mesmo porque se o cliente não tivesse encomendado o Paulista, este jamais voltaria em devolução. Não dava tempo, porque, despertador de gula, logo era devorado às dentadas.

Soube pelo meu amigo Marcos Gonçalves que o Toshio está firme, forte e aposentado aos 83 anos, infelizmente para todos seus fanáticos ex-fregueses. Circula à pé próximo das ruas Oscar Rodrigues Alves e Major Mendonça,  onde mora  e frequenta o bar Flórida, na esquina da Luiz Pereira Barreto com Afonso Pena, para um prosaico café da manhã com pãozinho na chapa. Quem quiser autógrafo, basta acordar bem cedinho, pedir um café de coador no Flórida e aguardar a chegada triunfal do Toshio. 

Jeremias Alves Pereira Filho - Sócio de Jeremias Alves Pereira Filho Advogados Associados; Especialista em Direito Empresarial e Professor Emérito da UPM-Universidade Presbiteriana Mackenzie.  Araçatubense nato.