16 de julho de 2024
RELIGIÃO

Mistério da salvação

Por Padre Charles Borg | Especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 2 min
Reprodução/ Musei Vaticani
S. Paulo, escola pós-bizantina

A caridade não acabará! O conhecido hino da caridade, que se encontra na primeira carta do apóstolo Paulo aos cristãos de Corinto, é uma das páginas mais conhecidas da Sagrada Escritura! O que pouca gente nota é que este hino se insere num contexto eucarístico. Imediatamente antes de apresentar seu celebrado texto, o apóstolo Paulo repreende energicamente os cristãos da cidade de Corinto por sua total falta de atenção para com o outro num ritual que tem como marca principal o convívio fraterno. A celebração da Eucaristia, de fato, é primordialmente um ritual de irmãos e irmãs congregados para celebrar a Aliança da Salvação, partindo entre si o alimento sagrado do Corpo e Sangue do Senhor Jesus Cristo!

Basta lembrar-se que a primeira missa deu-se no ambiente da Ceia Pascal judaica, ritual marcadamente familiar e festivo. Verdade esta que deu origem à primeira designação do ritual: a celebração da partilha do pão! A designação acena para o profundo grau de familiaridade e de amizade que deve existir entre os convivas. É expressão de tenro apreço repartir o pão com alguém. No relato dos Atos, o evangelista Lucas coloca a fraterna caridade como um dos elementos fundamentais a atrair novas pessoas à fé cristã.

Com o passar do tempo e com a expansão das comunidades cristãs, as celebrações litúrgicas perderam o aspecto primitivo de celebrações familiares e envolventes. A participação na liturgia eucarística, gradualmente, passou a ser entendida e vivida precipuamente no aspecto individual e intimista. A transição deu-se também por conta da ênfase excessivamente doutrinária utilizada na catequese eucarística. A centralidade deixou de ser a partilha fraterna do Corpo e Sangue de Cristo, natural gesto de fraterna aproximação, para fixar-se na profissão doutrinária da presença real do Senhor sob as espécies eucarísticas. Até em nossos dias, fica evidente reparar como para muitos, participar da celebração eucaristia, e consequentemente da comunhão Eucarística, é um ritual de adoração, de piedade individual. Sem dar-se conta, as comunidades cristãs, envolvidas por esta ambígua espiritualidade eucarística, repetem os mesmos equívocos da comunidade de Corinto, merecedora das advertências do apóstolo Paulo.

Entender, e viver, a celebração eucarística em sua original e profética dimensão fraterna é oferecer ao mundo atual, marcado pelo distanciamento e carente de fraternal aproximação entre as pessoas, eloquente testemunho de comprometida caridade. Congregando seus discípulos em torno de uma mesma mesa, iluminando-os com a mesma Palavra e alimentando-os com o mesmo Pão, o Senhor Jesus profetiza que um outro mundo é possível, marcado por uma caridade sempre viçosa, sempre fecunda! Viver a Eucaristia em sua mais profunda dimensão de precioso e admirável banquete representa o mais acabado, e convincente, anuncio profético do mistério de salvação!


Padre Charles Borg é vigário-geral da Diocese de Araçatuba